domingo, 1 de dezembro de 2013

 
O toque suave da melodia pesava nas folhas. E caíam. Sobre as nossas cabeças, leves de tanto peso. De tanto sentimento no entanto, com tanta perturbação. De tanta vontade anónima de libertar os ramos e criar as raízes interrompidas pelos pensamentos cautelosamente premeditados. E caíam, sobre os nossos ombros, o peso do vento. O peso do toque, carregado de olhares. Olhares carregados de verdade. (...)

É pensar no saber. Pensar que o sei. Que sei por quantas partes se dividem esta grande parte, em tantas vezes, já partida. Na verdade, não saber nada, mas saber a consciência do nada perdida no todo que persiste. Não saber. Ser o livre, sem cautelosamente pensar nas partes lesadas e nas partes inteiras que restam intactas de pouca consciência. Pois é não saber quase nada. Ou saber tanto. Do nada.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

 
És o arquiteto do desequilíbrio. És a edificação do desassossego. Recriação da tepidez e a implantação da instabilidade. És. O alfaiate da consciência.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Cheira a sândalo.
Cheira a roupa limpa e cheira novamente a sândalo. Cheira ao velho misturado com um novo que é tão antigo, quanto a idade das luzes que se cruzam na cidade. O novo é tão novo que faz o rodopio da mente e o arrepio das costas. É tão novo que pestaneja com a falta de uma lógica certa, arredondada à verdade universal. É novo, porque recria o antigo, mas não como novo. Cheira a papel de parede desbotado, a roupa guardada e livros arrecadados nas estantes à décadas. Cheira a um desleixo cuidado, com pegadas de gato pela madeira que faz música para doidos. O pó do antigo, inalado, faz perder os sentidos do sentir. E momentaneamente o sentir dos sentidos, que rapidamente é recuperado através do ar que entra pela janela de vidro sujo e portadas partidas que batem abruptamente na pedra silenciosa. E este som é mudo aos ouvidos, estes com focagem nas notas de músicas que se esbatem nas paredes das grandes salas vazias. Cheira a frio e a chuva que entra sorrateiramente, molha o chão seco e pisado. A mente despida de força, sobe os degraus velhos que gritam desmedidamente não acordando os tais de sentidos do sentir. E agora, o toque das notas incita a consciência por um fio de algodão enlaçado numa agulha que se cose no teto dos sonhos, o novo apareceu. O antigo permanece.



sexta-feira, 18 de outubro de 2013

O ar pesado era silenciosamente abraçado pela brisa suave que corria pela cidade. A imensidão de gente que passa, mas não olha. Apenas passa. Num todo, mas individualmente. Fixando o escuro do alcatrão preso às suas vidas rotineiras. Esse olhar é vazio, mas inteiramente preenchido por grandes e minúsculas preocupações que se espalham de forma abrupta pelo inconsciente, outrora consciente. Não existe comoção, apenas circunspeção nos sentimentos.
Encontram-se também os que não fixam as pedras da calçada, porque sabem bem por onde caminham. Fixam sim, um todo drástico saturado de mistérios céticos, consumidos de verdade. Esses que nos fitam de quando em vez, com o seu olhar absorto e inalterado. O olhar profundo que transpõe a mente ao mínimo vislumbre, alastrando-se, para além da banalidade.





 

sábado, 12 de outubro de 2013

E prometo.
É a tua ausência tão áspera que me faz recuar para o tempo sobrepensado da loucura permanente. Aquele tão impetuoso que me cola ao chão cinzento desgastado. Arrasta a existência para a melancolia perlongada nos pensamentos irracionalmente despidos de teto.
E assombra, o ser?

Não te demores.

domingo, 6 de outubro de 2013





Percorri-te por entre os antigos edifícios da cidade. A brisa acompanhava-me enquanto aos poucos me perdia nas velhas e altas fachadas desbotadamente preservadas pelo tempo. Mas o folego faltava e a respiração ordinária tornava-se cada vez mais ofegante. Mais uma vez, permanecer fora da infinidade da minha loucura seria o local seguro, mas caminhei ao teu encontro, ao encontro dela mesma na seu estado bruto. Encaminhaste-me para um jardim, um dos maiores que alguma vez havia avistado. Ostentava um enorme lago que era atravessado por pequenas pontes. E eu escolhi a ponte de pedra, por ser  mais segura. Talvez. Mas ainda assim, os meus pés vacilaram enquanto caminhavam. Cheguei ao outro lado e não te encontrei. Encontrava-me surrealmente cercada por arvores que se estendiam magicamente até ao céu. Contavam-me histórias dos tempos anteriores e eu apenas lhes sorria com os olhos consumidos pelo esplendor que assistia. Sentei-me silenciosamente a conversar com uma e foram inúmeras as vezes em que perdi os enlaces das histórias que contava.  Pequenos círculos eram formados na superfície do lago, transformando-o num espetáculo imenso onde a Natureza se envolve numa só.  Despedi-me da sombra que me abrigava da chuva e caminhei rumo à ponte de madeira, recuperada do receio que antes se apoderara. Avistei-te do outro lado. Sorriste.  Mas a confusão entrelaçou a minha mente num ápice. O teu sorriso, podia apenas ser um vislumbre irracional. O teu sorriso, esse que tinha sido sempre melodicamente inexistente até aquele momento. Atravessei a ponte em instantes que o relógio não podia contar e cheguei a ti. Seguraste me nos teus braços e as nuvens demoradamente se abriram, deixando o sol aquecer os nossos corpos molhados da chuva que se antecedera. Soltei-me de ti, não o impediste, mas os teus olhos desatentamente fixaram. Em mim? Não. Mais do que isso. Em todo o meu ser. Provocando a tão habitual avalanche abaladora no meu peito. E a insanidade apoderou-se mais uma vez da mente destorcida. Não sorriste mais, como esperava que o tivesses feito. As pernas fraquejaram, mas o resto do corpo não se movia com medo de perder o equilíbrio restante. Caiu então sobre mim, a inabalável sensação de receio que tanto me caracterizava, perdi a força novamente e mentalmente desfaleci com a perda dos sentidos. Inspirei forçosamente, tentando sentir o ar a entrar, e recuperei essa tal de força novamente. Desmedidamente segurei o meu peito com medo que este se perdesse na imensidão vazia que se tornara o meu corpo e deixei-me cair avassaladoramente sobre o teto falso que antes me mantinha perigosamente segura. E então ela veio, de mansinho. Começando pela boca, que jurou secretamente não falar. Seguidamente os olhos, que pareciam secar o lago que nos fazia companhia. Ela, veio com toda a força que a caracterizava. A dor veio. E esta seria, a da perda, mais uma vez. Serenamente, seguraste-me a mão e durante breves segundos, assim permaneces-te. Inclinaste-te, beijando-me a testa e partiste. Permaneci estática vendo-te partir. No entretanto, as árvores lentamente te rodeavam, fazendo falsamente esquecer a tua existência permanente no inconsciente da minha alma, doentia.

sábado, 5 de outubro de 2013


(...) tons.
 


Repletas de papel de parede. Papel repleto de memórias e postais capturados de ansiedade. Por entre brechas, paredes desbotadas e danificadas ao toque da minha mente. Palavras a pairar no silêncio da minha voz tão familiar. Dos imensos tons que a caracterizam num tão pequeno espaço, não de tempo, mas de espaço. O tom de desespero, esse que demasiadas vezes se precipitou como uma flecha num sonho, agonizando os pensamentos de forma brutal e desleal. O tom de apatia, esse praticamente inexistente, que era suportado pela respiração fragmentada do choro. O tom de excitação, esse tão familiar, mas desvanecido, que por entre as sombras reaparecia momentaneamente. (...)

sábado, 21 de setembro de 2013



 

 
 
 

Noites quentes de novembro 
Emaranhada nos lençóis por entre sonhos a dentro. 
Irrespirável ar, de quem não sabia ficar 
Nem no porto, quanto mais em pleno mar.
Noites quentes de novembro.
O vendo refresca as faces,
e a mente perdida nos enlaces
a girar em direção ao centro.
 Noites frias de dezembro,
Perdida na ilusão,
Ilusória de ti mesmo.
Noites frias de dezembro,
Portões fechados a seis chaves,
Portas esbatidas na minha irrealidade.
Noites frias de dezembro,  
alegria encobrida pela fé de um outro mundo.
 Noites gélidas de Janeiro,
E a vista para a cidade,
Como de quem não sabe.
como de quem não sabe, nada.
Noites gélidas de janeiro
A alvorada perdida,
em soluços e desvaneios.
Noites gélidas de janeiro
e o medo de ter,
o medo de perder,  
aquilo que é nada. 
Aquilo que sempre foi o nada.
 Vem, ser a minha paz imunda
que se centra só em mim.
Vem, ser aquilo que eu sempre quis
Embora infeliz de quem nunca teve nada
nada de verdade.
 

quarta-feira, 11 de setembro de 2013



(...) A janela não me incomoda aberta. Por muito que incomode a tantos, a mim não. Sei que assim os outros verão tal como os poderei ver a eles, mas acredito que não o faram, pelo menos por agora. E este agora, é que interessa. Precisamente o agora em que consigo sentir as pálpebras a fechar e o meu corpo a pedir para se deitar, assim como a minha mente a suplicar por mais um daqueles sonos, ou sonhos tão irreais que me arrastam da confusão desta tão suposta realidade. Resisto a fecha-las, porque a vontade de ver estas palavras correr à velocidade da minha mente é demasiado tentadora para uma mente tão perdida quanto a minha. Os ponteiros do relógio tão pouco me incomodam, mesmo sabendo que para muitos outros eles estejam fixos  na escuridão da noite, ou então ocultos pelos pesadelos arrastados das realidades deles mesmos.  A janela esta aberta e sentada na cama consigo avistar o céu. Está escuro, mas com tons de laranja.

 

terça-feira, 10 de setembro de 2013


 (...) de ti.
 




É consumir me da ideia de ti. Da ideia da distância tão permanente abraçada na brisa que me entrega noticias de ti. Na capacidade folgaz de te permanecer mais um pouco na irracionalidade mais dispersa de mim. É corromper a alma já antes roubada pelo fio do desejo de te ter, não em mim, não em ti. É dividir mais uma das milhares de vezes as partes já partidas da minha metade lesada pelo todo inexistente de ti. E respirar o folego tão teatral que se perde na insanidade do palco, com vista para a plateia que são os teus olhos não presentes. Imerso no todo. Nesse todo ilusório de ti. Na imagem guardada a sete mil chaves. Imagem retorcida do teu rosto séptico, pendente dos meus movimentos, das palavras mal expressadas e dos atos absurdamente desligados da capacidade de me rodear de ti e apenas de ti. Dos talvez sentimentos descritos por palavras no calor da distancia que antes nos desuniu. Da vontade inexplicável e incompatibilidade compatível de te ter no mais vago dos suspiros suspensos em mim. Por isso queria, queria a alma corrompida arrastada pela maré das águas do rio, inexistente. Por isso não sei se queria. Mas queria sim, respirar de ti a força do vento naquele Inverno frio que emanava nostalgia e presença tua. Por tudo isso e por mais mil histórias de loucura deitadas à sorte, queria. Pensas tu que não queria? A certeza de um todo de ti é alucinadamente substituída pela derradeira clonagem dos métodos inexperientes impostos por mim. Por isso digo com a força das pedras, não da calçada, do rio. Essas que se moldam, tal como me moldei inconscientemente à ideia de ti, por mais penosa que se ressentisse no meu tão disperso espírito. Pensas tu que não queria? Viveria de ti, até ao tempo das palavras secretas escritas não em paredes, mas em folhas desbotadas, pena e tinta. Até lá, Jane Austen pesaria nas minhas estantes e no meu pensamento já carregado de ti. E mais uma vez, viveria de ti até ao vislumbre do pôr-do-sol e depois dele. Mesmo rodeados de desequilíbrio e cordas bambas, mergulharia na imensidão e na imunda paz que me traria, por isso, novamente porque me consome, viveria. Diz-me então com palavras de papel desbotado, pena e tinta se não viveria eu de ti. Porque no pôr-do-sol mais próximo, as ondas vão levar-me e deslumbrar-me ilusoriamente por um outro que em pouco se assemelha a ti. Na tentativa de não desesperar no perdido passado, tentarei ser sem a ideia de ti. Passarás a ser apenas a capa de um livro entreaberto que com as mãos sumidas pelo medo hesitei em abrir, perdendo então o enredo, as personagens e toda uma viagem. Tudo pelo receio de descobrir que afinal és mesmo feito de papel desbotado, pena e tinta.  

segunda-feira, 9 de setembro de 2013



 
 
Podia ter parado para escutar o som dos grilos, mais uma vez. Tão banal, mas por breves segundos tão valioso pela possibilidade de ser uma ultima vez. Ao invés disso, prossegui apressadamente para o quarto, como todas as noites, com a não pressa de dormir. Queria escrever, não sobre o quê, ou sobre quem. Mas sim, sobre como. Como de mil e uma maneiras a minha mente se desfez em pedaços de literatura espalhados pelas faces pálidas e rostos desvanecidos da sociedade. Como  tanto e tão pouco se redesfaz em mais pedaços, espedaçados por pequenos pedaços de momentos. A tão certeza de uns e a não precisão dos mesmos. É encontrar a certeza mais do que uma centena desmantelada de vezes. É perde-la no breve e longo pensamento de ti. Naquele habitual que me corrompe a mente e que tão perfeitamente conhece as minhas veias, de as percorrer a uma velocidade extravagante. Mais uma válida minúscula oportunidade te me rodear de ti e uma desculpa escanzelada de me recordar de ti, como hábito de certo duvidoso e conflituoso com ele mesmo.