sexta-feira, 18 de outubro de 2013

O ar pesado era silenciosamente abraçado pela brisa suave que corria pela cidade. A imensidão de gente que passa, mas não olha. Apenas passa. Num todo, mas individualmente. Fixando o escuro do alcatrão preso às suas vidas rotineiras. Esse olhar é vazio, mas inteiramente preenchido por grandes e minúsculas preocupações que se espalham de forma abrupta pelo inconsciente, outrora consciente. Não existe comoção, apenas circunspeção nos sentimentos.
Encontram-se também os que não fixam as pedras da calçada, porque sabem bem por onde caminham. Fixam sim, um todo drástico saturado de mistérios céticos, consumidos de verdade. Esses que nos fitam de quando em vez, com o seu olhar absorto e inalterado. O olhar profundo que transpõe a mente ao mínimo vislumbre, alastrando-se, para além da banalidade.





 

sábado, 12 de outubro de 2013

E prometo.
É a tua ausência tão áspera que me faz recuar para o tempo sobrepensado da loucura permanente. Aquele tão impetuoso que me cola ao chão cinzento desgastado. Arrasta a existência para a melancolia perlongada nos pensamentos irracionalmente despidos de teto.
E assombra, o ser?

Não te demores.

domingo, 6 de outubro de 2013





Percorri-te por entre os antigos edifícios da cidade. A brisa acompanhava-me enquanto aos poucos me perdia nas velhas e altas fachadas desbotadamente preservadas pelo tempo. Mas o folego faltava e a respiração ordinária tornava-se cada vez mais ofegante. Mais uma vez, permanecer fora da infinidade da minha loucura seria o local seguro, mas caminhei ao teu encontro, ao encontro dela mesma na seu estado bruto. Encaminhaste-me para um jardim, um dos maiores que alguma vez havia avistado. Ostentava um enorme lago que era atravessado por pequenas pontes. E eu escolhi a ponte de pedra, por ser  mais segura. Talvez. Mas ainda assim, os meus pés vacilaram enquanto caminhavam. Cheguei ao outro lado e não te encontrei. Encontrava-me surrealmente cercada por arvores que se estendiam magicamente até ao céu. Contavam-me histórias dos tempos anteriores e eu apenas lhes sorria com os olhos consumidos pelo esplendor que assistia. Sentei-me silenciosamente a conversar com uma e foram inúmeras as vezes em que perdi os enlaces das histórias que contava.  Pequenos círculos eram formados na superfície do lago, transformando-o num espetáculo imenso onde a Natureza se envolve numa só.  Despedi-me da sombra que me abrigava da chuva e caminhei rumo à ponte de madeira, recuperada do receio que antes se apoderara. Avistei-te do outro lado. Sorriste.  Mas a confusão entrelaçou a minha mente num ápice. O teu sorriso, podia apenas ser um vislumbre irracional. O teu sorriso, esse que tinha sido sempre melodicamente inexistente até aquele momento. Atravessei a ponte em instantes que o relógio não podia contar e cheguei a ti. Seguraste me nos teus braços e as nuvens demoradamente se abriram, deixando o sol aquecer os nossos corpos molhados da chuva que se antecedera. Soltei-me de ti, não o impediste, mas os teus olhos desatentamente fixaram. Em mim? Não. Mais do que isso. Em todo o meu ser. Provocando a tão habitual avalanche abaladora no meu peito. E a insanidade apoderou-se mais uma vez da mente destorcida. Não sorriste mais, como esperava que o tivesses feito. As pernas fraquejaram, mas o resto do corpo não se movia com medo de perder o equilíbrio restante. Caiu então sobre mim, a inabalável sensação de receio que tanto me caracterizava, perdi a força novamente e mentalmente desfaleci com a perda dos sentidos. Inspirei forçosamente, tentando sentir o ar a entrar, e recuperei essa tal de força novamente. Desmedidamente segurei o meu peito com medo que este se perdesse na imensidão vazia que se tornara o meu corpo e deixei-me cair avassaladoramente sobre o teto falso que antes me mantinha perigosamente segura. E então ela veio, de mansinho. Começando pela boca, que jurou secretamente não falar. Seguidamente os olhos, que pareciam secar o lago que nos fazia companhia. Ela, veio com toda a força que a caracterizava. A dor veio. E esta seria, a da perda, mais uma vez. Serenamente, seguraste-me a mão e durante breves segundos, assim permaneces-te. Inclinaste-te, beijando-me a testa e partiste. Permaneci estática vendo-te partir. No entretanto, as árvores lentamente te rodeavam, fazendo falsamente esquecer a tua existência permanente no inconsciente da minha alma, doentia.

sábado, 5 de outubro de 2013


(...) tons.
 


Repletas de papel de parede. Papel repleto de memórias e postais capturados de ansiedade. Por entre brechas, paredes desbotadas e danificadas ao toque da minha mente. Palavras a pairar no silêncio da minha voz tão familiar. Dos imensos tons que a caracterizam num tão pequeno espaço, não de tempo, mas de espaço. O tom de desespero, esse que demasiadas vezes se precipitou como uma flecha num sonho, agonizando os pensamentos de forma brutal e desleal. O tom de apatia, esse praticamente inexistente, que era suportado pela respiração fragmentada do choro. O tom de excitação, esse tão familiar, mas desvanecido, que por entre as sombras reaparecia momentaneamente. (...)